Papa francisco caminha sozinho na Praça de São Pedro no Vaticano, Itáia

A romantização do Coronavírus

Não sou cristã, mas as imagens do Papa Francisco a caminhar sozinho na Praça de São Pedro no Vaticano, não me passam despercebidas e acentuam o “silêncio ensurdecedor” e o “vazio desolador” da “noite que cai há semanas”.

A benção Urbi et Orbi (Benção à Cidade e ao Mundo) é feita pelo Papa em apenas três ocasiões: quando é eleito sucessor de Pedro, no Natal e na Páscoa. No entanto, os últimos acontecimentos levaram a que o pontífice se quisesse dirigir ao mundo através de uma benção extraordinária.

Ouço e leio pessoas a dizer que “a pandemia está a indicar o caminho a seguir para parar esta civilização suicida” ou que esta pandemia é inócua quando comparada com a guerra e a fome no resto do mundo e (a minha favorita) que “nada acontece por acaso e que são os empurrões do Universo que nos vão guiado e posicionando no nosso caminho”.

Quem romantiza esta pandemia não é certamente quem tem familiares a sofrer no hospital ou mesmo em estado crítico. Sei que parece óbvio, porque o nosso quotidiano e os nossos hábitos se alteraram  profundamente, mas não é o vírus que vai começar uma revolução. A revolução começará sim, no potencial transformador do silêncio e da introspecção desta quarentena. Parar tem um potencial transformador.

O Papa Francisco reza na praça vazia do Vaticano

Uma reflexão

Quem vive no caminho da transcendência, vive no caminho da mudança, da emergência. Para nos transcendermos é necessário mudar. Mas não romantizemos esta pandemia. Parar, sem nos dedicarmos a uma fase de introspecção, não será suficiente. Se assim for, depois de tudo terminar, as pessoas vão continuar a sair e a máquina do capitalismo destrutivo vai continuar a moldar o mundo em que vivemos.

Para mudar é necessário alcançar uma consciência mais profunda sobre as máscaras que carregamos e que teimam em não cair porque estão profundamente enraizadas nos nossos ideais, nas nossas verdades incontestáveis, na nossa altivez, nos nossos egos e nas nossas supérfluas seguranças. Estamos tão presos aos nossos ideais que desdenhamos e julgamos incessantemente. Cada passo nosso é mais um passo para a ilusão que carregamos.

O nosso pensamento individual reflecte o pensamento colectivo da sociedade. Há que ver no mundo um espelho de nós mesmos. Há que persistir na busca de uma consciência mais elevada, mais profunda.

Nesta paragem aproveitem para se questionar, como é que os nossos comportamentos afectam a sociedade? Como é que posso agir de forma a contribuir positivamente para o mundo, para reduzir a minha pegada ambiental, para prosseguir as minhas paixões?

Definir prioridades, tomar decisões que nos transformem e que transformem a forma como funcionamos em comunidade.

Não romantizem esta pandemia. Mudar a sociedade está nas nossas mãos, o universo não age sozinho. A responsabilidade é nossa e ainda bem. Afinal, reside em nós o verdadeiro poder para mudar.

 

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Assinatura a eterna insatisfeita